segunda-feira, 26 de março de 2007

a última chucha

A dentista tranquilizou-me as preocupações por entre os zumbidos da broca. Que é só a partir dos quatro que a arcada superior começa a deformar-se e que as ligeiras discrepâncias que já lá ziguezagueiam se vão encarreirando progressivamente sózinhas. Não descansei muito, que os anos e as experiências ainda não me ajudaram a ultrapassar os medos de ir ao dentista e não me apetece nada duplicar os (sempre adiados) martírios. Mas também não quis cortá-la nem fazê-la desaparecer misteriosamente nem forçá-lo nem impôr-lhe prazos. Fui conversando, explicando dentes entortados e vantagens de meninos crescidos e desvantagens de bebés. Ouviu-me e percebeu mas faltou-lhe a coragem Eu ainda sou pequenino. Quando quescer mais logo deixo de usar chucha. Aceitei-lhe os ritmos. Deixei-lhe a decisão.
Os caninos de menino romperam a borracha. Ridicularizei a compra de uma nova, o miúdo a um mês de fazer os quatro anos, mas não o achei capaz de adormecimentos de boca vazia. Ontem de manhã pediu-me se a podia ir pôr no lixo. Tu a seguir compas-me uma nova, mãe, eta tá velha, já não serve. A preocupação soou-me tão inexistente que o suborno saíu-me antes de o pensar Ah, eu ía comprar aquela baleia que tu queres muito mas não tenho dinheiro para as duas coisas, assim vou comprar a chucha e já não posso comprar a baleia. Certificou-se se a fofinha (a fralda de pano) podia ficar, escolheu a baleia, deitou a chucha para o lixo sem saudades nem dúvidas. Fiquei lá um bocadinho a seguir às estórias a musicar o escuro com cucos e lobos e baratas e os bocejos entre desafinações asseguraram-me que os sonos íam ser rápidos e descansados. Sesta e noite sem um ai de ausências. Hoje, já a partilhar a almofada e o escurinho com a (merecida) baleia, abraçadinho à minha mão e à fofinha, participou-me Eu não peciso de chucha, já sou quescido. Tou muito feliz a cantar contigo e com a minha baleia.
Tive vontade de ficar lá a ouvi-lo crescer.

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