terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

a casa dos livros

Não a reparei da primeira vez, em que passeámos esperas pelas cinco e pelo Carlos que nos ía exibir o rés-do-chão com quintal e porta para a rua. Não concorreu, portanto, para a eleição. Acho que foi na seguinte, em que autografámos os papéis, primeiro outorgante, segundo outorgante, fiador (palavras com que também não simpatizo e que nunca se me afiguram nas prosas), o miúdo aos saltos no quintal ensolarado, os cães do vizinho em zangas ladradas ao inesperado desassossego, que a vimos. Grande, ataviada com muitas janelas, com relvas e arbustos à volta e com troncos e folhas a ultrapassarem o telhado, o portão de ferro solene, a calçada entre os canteiros. Uma biblioteca! Temos uma biblioteca aqui na rua debaixo!, alegrei o miúdo, impaciente com a mão que lhe impedia as correrias no passeio estreito. Só meia dúzia de passos de casa até aqui! A antiga casa de um marquês agora casa de livros. Chão de madeira, salas e mais salas, escadas suaves, um terraço grande, um rectângulo lá atrás com quatro laranjeiras. Sonho com uma casa assim, menos espaçada nas áreas, mas assim, com janelas grandes cheias de sol, com o castanho antigo da madeira no chão, com uma terra com frutos a crescer.

A nossa biblioteca recebe-nos nas tardes de chuva e nas de sol. Empresta-nos cinco livros a cada um para reler durante quinze dias, mais filmes e músicas e jogos. E quando não tem os da kalandraka e os da oqo pesquisamos aqui e o Pedro pede às vizinhas. Tem duas salinhas coloridas para os meninos encaixarem e desencaixarem e desarrumarem legos e dominós e outros pedaços pela alcatifa de corda onde não é preciso estar sempre a dizer Chiu, aqui tens que falar baixinho. Conhecem-nos e conhecemos quase todos os que lá trabalham. O meu miúdo teve cartão da biblioteca antes de ter identidade. O nosso utente mais jovem, chama-lhe sempre a Cláudia, que agora tem um bebé na barriga, já viste, mamã? E oferecem-lhe rebuçados, pedem-lhe ajuda para desmagnetizar os livros e elevam-no a um metro do chão para conseguir dar duas voltas na fechadura com a chave antiquada mais comprida que a mão dele.

Cresce no meio dos livros. E eu gosto tanto que uma das casas da infância do meu filho seja aqui a biblioteca da rua debaixo...

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