sábado, 1 de setembro de 2007

sistema maternal

Hoje, amanhã, segunda, terça. Quarta começa. Assusto-me com as descontagens. Quatro dias. Só faltam quatro dias. Respiro fundo e declamo confiantemente as minhas falas. Elogio-lhe a escolinha amarela, as maioridades, os divertimentos com os outros meninos, as tintas. Digo-lhe que vai ser bom e que ele vai gostar muito. Minimizo-lhe as ansiedades e as preocupações com os almoços, Mas porque é que não me vais buscar para vir almoçar a casa?, com mastigações divertidas em grupo. Respiro fundo outra vez e torço para não estar a mentir.

Vamos deslocar-nos. Os nossos dias vão passar a ser os dias dele e os dias meus. E isso é bom e é mau. Temo-nos orbitado um ao outro nestes quatro anos e quatro meses, revezando-nos entre planeta e satélite, e agora independentizamo-nos. Vai assumir-se pequeno planeta luminoso com uma rotação própria no sistema escolar. E eu gosto de o ver crescer pessoa, gosto muito, mas pergunto-me se teremos tempo, depois. Tempo para desenhos, tempo para apanhar flores, tempo para jardinar futeboladas com a Boba, tempo para brincarmos ú-ú-ú com os comboios, tempo para nos fartarmos um do outro... Pergunto-me se não nos sobrarão só os preceitos, banho, cortar unhas, secar cabelo, jantar, abrir a cama, preparar roupa do dia a seguir. É que eu gosto tanto dos despreceitos...

E, à medida que os dias decrescem, parece que crescem as tarefas finais. Listo lavar sandálias, fazer bainhas, comprar ténis, remendar joelhos do inverno ultrapassado, marcar bata e mais um sem fim de banalidades. Irrito-me. Invalido a lista dos tenho-que no balde dos reciclados. Fazemos gelatina de morango. Congelamos e descongelamos água e pão e bolo e pintarolas, Olha, papá, estamos a fazer experiências! Comemos queijadas de requeijão. Deixo-o ganhar quase sempre no jogo da glória. Lemos estórias. Pintamos versos de fotocópias antigas e mãos. Lavamos a loiça a meias.

Não é um satélite. Nunca foi. É um asteróide e eu é que o orbito. Já com saudades.

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