quarta-feira, 1 de setembro de 2010

errata

As longilíneas das sombras diminuem-lhe a grandeza e a saliência, que parece apenas um normal fim de tempo quase a transformar-se em pessoa. Ao vivo, sem o favorecimento da esguiez, é assustadoramente enorme. Eu própria, habituada a espelhá-la enquanto me visto, horrorizei-me há dias quando me desreconheci nos pixéis da máquina conjugal. De repente, sem darmos por isso, ascendeu a protagonista de um espectáculo em que não nos imaginávamos a participar. Na rua eu fui exonerada de pessoa e nós todos demitidos de família de dois adultos com duas crianças. Sózinha ou em conjunto, resumimo-nos à barriga. Desconhecidos olham, apontam, voltam a olhar, cotovelam, sussurram audivelmente Olha aquela grávida!, Que grande barriga!, voltam a olhar, sorriem, espantam-se, horrorizam-se, comentam. Na praia, com o biquíni e a ausência de vestido a desnudarem a verdadeira amplitude da protuberância, é onde as reacções mais se hiperbolizam. Alguns chegam a afoitar-se em questionários Isso deve estar mesmo quase, não?, Isso era para ontem?, São dois ou três que tem aí dentro?. Eu bem faço por insignificantar-me, mas não serve de nada. Lá vamos esclarecendo que Sim, são dois e estão crescidos e com mais semanas do que o esperado, um bocado enfastiados de tanto avultamento enquanto o miúdo grande, que antes era o primeiro a esclarecer quantidades e sexos e nomes, resmunga Bolas, quando é que eles nascem para isto acabar? É só a barriga, a barriga, a barriga, já ninguém repara em mim nem no Joaquim... Vou-o sossegando com uns Está mesmo quase, filho, tens que ter só mais um bocadinho de paciência., e ocultando o pressentimento de que isto é só a apresentação de um filme que prevejo abundante e maçador. Está quase, filho, que eu também já estou farta...

Sem comentários: